Sabe, eu me chamo Fabrício Dias de Oliveira. Se procurar no google,
verá que existem vários. Espero eu que meus sósias sejam boas pessoas,
pois não quero ser surpreendido com nome sujo sem ser minha culpa. rs. E
espero não me envolver em encrenca pra manter eles a salvo.
Desde
criança, fui mais reservado. Procurava não me envolver em confusão, e
quando acontecia, eu chorava. E também fui muito curioso. Eu pequeno,
ainda com mais ou menos 7 e 8 anos, foleava os livros de segundo grau de
biologia e química da minha tia, mesmo não entendendo nada, mas gostava
das figurinhas. Eu vi no meio das matérias, um texto de educação sexual
com figuras, e achei o máximo.
Quando comecei a achar os deveres
de casa chatos, me lembro que alguém me fez um pequeno terrorismo na
minha cabeça, me mostrou mendigos na rua, e me disse que se não estudar,
ia ficar assim.
Me lembro também de ter visto um desenho de um
rim, e um pedaço dos coletores de urina antes dos uréteres. Esse pedaço
parecia uma maquininha, e pensei que a gente era tipo ciborgues, com
partes mecânicas no corpo. Para ver como eu era viajante.
Quando
entrei na primeira série, fui para um colégio particular. O meu pai
descobriu um ofício novo para trabalhar por fora, para complementar o
salário de metalúrgico, e passou a fazer churrasqueiras de alvenaria
para os figurões da empresa onde ele trabalhava. E pensou que poderia
manter isso para mim.
Ilusão. Quando cheguei na segunda série,
fomos vítimas de ladrões, que levaram muita coisa em casa, até meu
carrinho de fricção preferido. Malditos. E precisei sair da escola para
que pudéssemos repor o que foi levado. Graças a deus saí de lá. Eles
caíam na minha pele pois todos lá eram filhos de empresários, e tinham
dinheiro e eu pobre e negro. Dá pra imaginar o tipo de coisa que eu
passava.
Fui para uma escola municipal, onde me senti mais a
altura dos outros. Até uma idade, mais ou menos até a sexta série,
gostava de participar das brincadeiras com os meninos. Até que o bulying
começou. Um grupo de 3 meninos, incitavam os outros a caírem na minha
pele. E eu não sabia reagir, e tinha reações idiotas... tentava
reproduzir as expressões que via em filmes, e eu era mais zoado ainda.
Mas,
se ficasse só nas brincadeiras, ainda era tolerável. O grande problema,
é que tinha um outro grupo que era mais encrenqueiro, e que partia para
a violência. E por causa do bulying do primeiro grupo, eles decidiram
me escolher como saco de pancada todo fim de aula, e ficou assim por um
tempo.
O que me fez ficar recluso. Participava da educação física,
obrigado. Os intervalos, ficava na biblioteca, já pensando em
estratégias para ir embora sem apanhar. Mas foi bom, li todos os livros
da coleção vaga-lume ali. E conheci mais livros do segundo grau, com
mais figurinhas legais.
Por causa de eu ter fugido ao invés de
enfrentar a situação, meio que deixei de interagir com o pessoal da
minha idade, a acabou que não aprendi convenções sociais, tipo, como
conquistar uma garota, como tratar os outros, como me portar em
ambientes formais. Resultado: só consegui o primeiro beijo com 19 anos,
fracassei em todas as entrevistas para emprego, até o dia em que eu
aceitei um trabalho voluntário em uma escola de informática comunitária,
e a maioria de minhas interações sociais terminavam em crítica,
brincadeiras de mal gosto (até nos empregos que consegui), terminando
algumas em término de relações (“amizades” e etc) ou brigas e
discussões. Foi um período difícil. Um grupo pequeno de pessoas ainda
conversaram comigo, meio que me resgatando do limbo da solidão que eu
procurava… nota especial que uma delas era minha esposa, que ainda
estava casada com o ex marido.
Enquanto isso, como vi que eu tinha
facilidade com informática, desisti de ser advogado porque tinha que
ler muito, e desisti de ser médico porque eu não tinha estômago pra
ajudar pessoas que iriam brigar comigo se eu não conseguisse ajudar (o
que não adiantou, pois quero agora ser arquiteto de software e
enfrentarei a mesma coisa, rs. Mas já estou treinando acalmar quem tá
nervoso, e com o tempo ganhei alguma prática nisso. Resumindo, estava
com medo a toa). E fiz 2 cursos técnicos e alguns profissionalizantes em
áreas afins, até que decidi pela faculdade. O governo nessa época
aumentou o poder de compra do salário mínimo, e foi a minha deixa. Meu
pai falou que nós dois juntos poderíamos pagar, e fomos fundo. Sistemas
de Informação na PUC.
O curso funcionou bem, como a maioria dos
conceitos eu conhecia, tirar notão foi fácil. E aumentavam mais ainda
pois eu viajava nos livros e teorias da área. Até que…
O início do
ponto de virada. A aula de filosofia. Eu queria aprender e aprender
cada vez mais. O professor perguntou para que era o conhecimento. Vieram
as mais variadas respostas, para ser bom em algo, conhecer muito,
status… todos errados. O professor explicou que o conhecimento servia
para ajudar as pessoas. Se eu conhecer muito, mas não souber tratar os
outros, não seria nada na vida. E ele falou. Vá a festas, casa uns dos
outros, saiam com os amigos. Aí passei a fazer isso para me tornar
alguém aprazível. Minhas notas abaixaram vertiginosamente, mas ganhei em
contato humano. Foi a melhor troca que fiz. Aí comecei a me relacionar
mais sério com mulheres. As anteriores sempre pulavam fora quando
propunha algo mais sério.
Segunda parte do ponto de virada: na
metade do curso, comecei a tropeçar a toa, me cansar fácil e minha voz
“phicô apfim”. E comecei a babar. Depois de muito pesquisarmos, descobri
que eu era portador de esclerose múltipla, e me internaram 3 meses.
Primeira vez na vida que fui reprovado em alguma matéria, duas mais
exatamente. Depois de um tratamento intensivo, me recuperei somente
mancando um pouco da perna esquerda. Com ajuda da PUC, completei a
faculdade. Só que mal sabia o tamanho do buraco que acabava de entrar.
Comecei
a piorar rapidamente, de 3 em 3 meses, perdia um pedacinho do meu
corpo, era quase sempre no lado esquerdo, principalmente na perna.
Chegou um ponto em que andar 1 quarteirão era muito. Me esgotava com
metade disso. Era um problema grande, só uma cadeira de rodas,
motorizada funcionou. Parei de trabalhar, para ficar 7 anos me
recuperando, preso em meu próprio corpo.
Comecei a me recuperar,
mas muito vagarosamente, sem esperança de retomar minha vida. Até o
momento que soube de um tratamento experimental à base de vitamina D que
estava recuperando doentes de esclerose múltipla pelo Brasil. Demorou
mais ou menos 1 ano até o momento em que falei comigo mesmo. Eu estou
morrendo aos poucos. Falam que esse tratamento se feito errado, pode me
matar de uma vez. Beleza, morte por morte, vou na que tem uma chance de
melhora. E procurei o dr André de Vespasiano, com quem comecei o
tratamento. Ele só alertou: a vitamina D controla o sistema imune
(esclerose múltipla, é um desequilíbrio do sistema imune causado por
falta de vitamina D, em que ele enlouquecido começa a atacar o próprio
corpo, e no caso dessa doença, a capinha protetora das fibras nervosas),
mas ainda a função principal dela continua sendo o cálcio dos ossos.
Farei uma reposição dela em altas doses, o que ia me causar uma super
absorção de cálcio. Deverei tomar 2,5 litros de água por dia, e evitar
leite, laticínios e açaí. Ou ia petrificar meus rins ou qualquer parte
do corpo, mas principalmente os rins. Bom, diabéticos vivem muito bem
sem açúcar, posso viver bem sem essas coisas. E entrei de cabeça. Em 6
meses, a fadiga monstro sumiu. Deixei a cadeira de rodas. Em 1 ano, a
voz retornou a entonação normal (ainda um pouco mole, por causa da
língua que estava semi paralisada ainda), recuperei quase tudo. Só me
restou a perna esquerda sem força, o que me obriga a usar uma bengala
(deve ter tido alguma atrofia com essa história), mas já está ótimo.
Hoje,
estou trabalhando, fiz uma pós graduação, me casei, e estamos esperando
uma filhinha. Pra quem esteve desacreditado e ameaçado a perder tudo,
está de bom tamanho.
E esse é o resumo bem resumido de minha vida
até aqui. Isso serve para exemplo, tudo o que conquistei foi porque
estudei como louco desde criança. Se consegui uma colocação média no
mercado de trabalho (que foi a base de tudo), foi porque apesar de tudo,
concluí a faculdade, o que me possibilitou achar um caminho para
superar uma doença que ia me deixar de joelhos por toda a vida, e
retomar meus projetos. Raros casos a pessoa não precisa estudar tanto,
mas, o que realmente garante a compreensão da realidade como um todo e
nosso lugar entre as pessoas, é o estudo. E isso vale para todos.